21 de set. de 2011

Com a palavra, o pai...

Meu nome é Diogo Henrique, tenho 28 anos, sou casado com a Kellen, criadora deste blog.
Antes de mais nada preciso relatar como essa benção, dentre outras apareceu em minha vida. Ela apareceu de repente, como que por acaso, geralmente é assim a vida, surpresas e provações aparecem  todo momento. Ela foi uma delas, a primeira melhor que aconteceu em minha vida. Nosso relacionamento sempre foi amoroso, transparente e sincero, planos foram traçados pra nossa vida juntos. O sonho do casamento, um lar e filhos. Sempre gostei de planos, mas como disse antes, a vida é cheia de surpresas. E essa foi a segunda melhor de todas. A Kellen estava grávida, esperando um filho meu. Situação que não esperávamos naquele momento, mas quando ela me contou, fui transformado! Me enchi de alegria e orgulho, junto da responsabilidade que adquirira naquela hora. Nossa atual condição na época era delicada, estava morando e trabalhando em São Paulo e ela em Aparecida. A distância era um obstáculo. Estávamos super felizes,  porém receosos de como proceder dali em diante. Mas tínhamos a certeza que Deus ia nos ajudar. Os primeiros meses foram de mimos e a cada dia uma descoberta, uma mexida, uma reação quando conversávamos com o neném. A distância que nos separava era cortante e dolorosa, minha vontade era de largar tudo e ficar ao lado dos meus amores, mas sabia que eu tinha uma nova responsabilidade: Pai, marido e chefe de família. Tinha que arcar com isso. Agüentei firme.
   Os meses foram se passando e o dia da primeira ultrassom chegou. Não me continha de ansiedade. Quando a médica disse que era uma menina, já tinha o nome de imediato. Maria Eduarda. Ouvir o coraçãozinho dela batendo foi indescritível, a melhor sensação da minha vida, naquele momento eu sabia. Sou pai. Serei o melhor do mundo pra ela. Não controlei a emoção e chorei de felicidade. Abracei e beijei minha esposa e nossa filha se contorcendo e chutando com o longo beijo que dei na barriga da minha esposa. Meu pai e minha sogra estavam presentes, a médica nos deixou à sós na sala do exame. Quando saímos, estavam a médica, meu pai e minha sogra conversando, não consegui reparar na feição deles, mas senti que meu pai ficou feliz mas de um jeito contido, e não liguei porque meu pai sempre foi mais reservado. Me deu um abraço apertado, pude sentir o orgulho que ele tinha por mim nesse abraço.
   Tínhamos mais um motivo pra comemorar. Estávamos nos casando no dia seguinte, uma cerimônia no civil, uma festa reservada à familiares e amigos próximos. Pequena viagem de lua-de-mel em seguida. Um final de semana prolongado, viagem simples, nossa condição ainda não nos proporcionava um conforto adequado. Nossa primeira parada no retorno da viagem foi a clínica para retirar o resultado do exame.
   É estranho quando apenas ao olhar para a pessoa que amamos, sabemos o que está sentindo, não? Ao abrir o exame, o silêncio da Kellen me arrepiou, o rosto sério, pude sentir que algo estava errado, ela me disse: "tem algo errado com o exame!" De um nome técnico, surgiu a dúvida. O que é anencefalia? Corremos para falar com nossa médica, ela não estava e falamos com outra.
     Médicos são formados para salvar vidas, passam anos e anos estudando se especializando, mas acho que falta uma matéria indispensável ao currículo deles: sentimentos. Me perdoem meus amigos médicos, mas foi a sensação que senti naquele momento quando a obstetra,  fria, simplesmente explicou do que se tratava, como se fosse uma questão de uma prova que realizava. Se fosse uma prova tinha ganhado um dez, mas como se tratava de pais que naquele momento descobriam o significado daquele nome técnico, ela ganharia um dez?
    Parecia que o consultório, a médica, a situação era um sonho, pesadelo no caso, que eu custava a acreditar. Quando sai, parecia que estava em outro mundo, não escutava nada, não via nada, ali, onde eu estava não existia, a vida que eu tinha, parecia que tinha encerrado ali e começado outra.
     Ao mesmo tempo que tentava entender o que estava acontecendo, tentava manter a calma da Kellen. Resolvemos fazer um outro ultrassom de emergência. Meu mundo desabou por completo quando o médico  confirmou o diagnóstico. Nada mais tinha sentido, a primeira pergunta que eu fiz foi, porque Meu Deus?! Por que nós?! O que fizemos para merecer isso?! Nem conseguimos entender, assimilar a atrocidade que a médica disse: " nesses casos não tem volta, um aborto é o melhor para vocês". O que ela sabe o que é melhor pra nós? É da minha filha que ela comentava?! Não consegui na hora nem ficar com raiva, não sabia o que fazia, saímos de lá mudos, pasmos, sem dizer uma palavra com o outro. Só consegui entrar no carro e dizer novamente: "Por que nós?!". O caminho até em casa foi longo, não conseguia dizer nada, fazer nada, nem chorar! Desabei mesmo, quando abracei minha mãe, as lágrimas de tristeza junto com indignação, raiva, tudo junto. Assimilar tudo isso levou tempo, a curiosidade de saber o que realmente nossa Duda tinha, foi o que ajudou a amenizar, a entender a dor.
    A Kellen continuou na casa dos pais e eu tentava me concentrar no meu trabalho. Foi difícil, mas meus amigos me deram força.
     Durante a gestação, adquirimos uma força gigantesca, o apoio mutuo entre eu e a Kellen foi o que nos manteve fortes e serenos. Decidimos continuar em frente com nossa filha, afinal é uma vida, a nossa vida. Demos todo o amor que podíamos durante o momento que ainda estava conosco. A Duda respondia à nossas conversas, nossos beijos, carinhos, ela entendia que a amávamos incondicionalmente.
    No dia 27 de outubro foi quando começou minha outra provação. Não sei de onde tirei forças pra ficar segurando a mão da Kellen durante o parto. Ao mesmo tempo que eu à acalmava, me segurava pra não chorar.
    O choro da Duda ao nascer, foi o som que me encheu de felicidade, mas também de tristeza, por que sabia que a Duda começava ali, uma luta para a vida, uma luta que infelizmente não tinha volta, e sabíamos disso. Um beijo nos separou naquele momento. Sai da sala em silêncio, entrei em desespero no saguão da maternidade, me ajoelhei e chorei, desabei literalmente, naquele momento o sofrimento que segurei toda a gestação para dar forças a Kellen acabou ali.  Não conseguia forças pra me levantar. Minha família me amparou, não dizia uma palavra, apenas chorava. Chorei por horas, sozinho, isolado, não conseguia conversar com ninguém.
    Passado o sedativo que aplicaram na Kellen, para acalmá-la, retornou ao quarto. A primeira visita pra Duda foi a mais dolorosa, vendo ela lutando pra viver, respiração forte, ela apertou nossos dedos com suas mãozinhas, perfeitas, lisas, pequenas, seus pezinhos grandes, seu corpinho gordinho, linda!!! Conversávamos com ela o tempo todo, ela nos escutava, tenho certeza disso. No final de cada visita, rezávamos e pedíamos ao papai do Céu, que ficasse do lado de nossa filha e não a fizesse sofrer mais, que sua missão entre nós tinha se encerrado, a mensagem que Deus e a Duda quiseram deixar foi entendida.
    Como acha que nos sentíamos pedindo pra que Deus levasse nossa filha pra que não sofresse mais? Era uma dor inigualável. Mas vê-la naquele estado doía muito mais. Cheguei a pedir que Ele me levasse no lugar dela pra não vê-la sofrer. Ela lutou por 3 dias, foram os piores 3 dias de minha vida inteira.
   Ela se tornou nosso anjinho da guarda no dia 30 de outubro.  Sabendo da situação, quando me ligaram do hospital, senti uma tristeza profunda, mas ao mesmo tempo alivio, porque nossa filha não sofria mais. Uma longa despedida ainda na encubadora, um beijo bem forte na sua face, apertando sua mãozinha, ainda sinto o beijo que dei nela, um beijo de pai em uma filha que tenho toda a certeza do mundo, pelo tempo que pude senti-la, tocá-la, foi amada intensamente.
    Amigos, a dor de perder um filho é indescritível, nunca superaremos essa perda, apenas aprendemos a tolerá-la. Eu e a Kellen amadurecemos muito nesses meses com a Duda, aprendemos muito com ela, aprendemos o dom do amor incondicional, o valor da vida, amor ao próximo. Deus nos deu um presente, temos nosso anjinho da guarda particular, nossa santinha, que sempre olha por nós.
     Esse é meu testemunho que compartilho com vocês. Minha experiência com a Duda. Eu particularmente senti falta na época  da  troca de experiências em outros casos, não tínhamos nenhum amparo sentimental de pais que passaram por essa situação,  aprendemos sozinhos, enfrentamos tudo sozinhos. Por isso a idéia de compartilhar e divulgar esse nosso sentimento. Sinto agora que era essa a missão que Deus quis passar, dar o nosso testemunho de vida, divulgar a outras pessoas que necessitam de um ombro, uma base para seguir, com apenas um propósito no coração: AME INCONDICIONALMENTE. Obrigado!

5 comentários:

  1. Diogo, aceite o meu abraço e a minha admiração. Vocês são pessoas abençoadas.

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  2. Obrigado Paulo. Aceito com muito carinho o seu abraço. Obrigado pelo apoio e pelas lindas palavras. Sei que também compartilha do nosso sentimento.

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  3. Muito emocionante! Belíssimo testemunho e uma excelente iniciativa. Tenho certeza que o exemplo de vocês dará frutos em outras famílias. Deus os abençoe!

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  4. Emocionante! Que Deus abenções sempre vocês!

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  5. chorei ao ler! Parabéns, vcs deram a duda a vida em momento algum pensaram em ceifar a vida. Com certeza, Deus tem um plano especial na vida de vcs.
    que Jesus abênçõe.

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